Futuro do Marketing de Causa
O marketing de causa, ou marketing de propósito, pode definir-se como a colaboração, em torno de uma causa, entre uma organização com fins lucrativos e outra sem fins lucrativos, retirando ambas benefícios dessa associação.
Pode ser ligado a causas primárias, que são salvadoras de vidas, como acontece com o combate à fome.
Mas podem também ser associadas a causas secundárias, que melhoram a vida, mas são menos importantes e menos urgentes, como acontece com iniciativas relacionadas com as artes ou a cultura.
Tem-se assistido ao longo dos últimos anos ao crescimento do marketing de causa, mas a crise global provocada pelo COVID-19, deverá acentuar essa tendência.
Conceitos Próximos do Marketing de Causa
O marketing de causa é frequentemente confundido com responsabilidade social, marketing social, filantropia, patrocínio, caridade ou angariação de fundos.
A confusão pode advir do facto de que todos estes conceitos próximos terem por finalidade uma causa.
Uma causa é, neste contexto, uma questão ou grupo, a quem alguém pode dar o seu apoio financeiro, político, legal ou físico.
A erradicação da poliomielite no mundo, ou a defesa do comércio local, são alguns exemplos de causas.
Vejamos com maior detalhe esses conceitos próximos.
Responsabilidade social
A responsabilidade social das empresas, tem um objetivo muito mais amplo do que apoiar instituições de caridade ou causas locais, pois inclui o impacto consciente que as empresas pretendem ter nas comunidades, no meio ambiente e na vida das pessoas.
Alguns exemplos:
- Gestão de resíduos, através da existência de recipientes para recolha de telemóveis, baterias e acessórios nas instalações físicas da Vodafone;
- O Programa de Voluntariado da Caixa Geral de Depósitos, que “pretende incentivar o espírito solidário, assente em dois eixos de atuação: as competências e o tempo dos colaboradores ao serviço da comunidade”.
Marketing social
No marketing social, as organizações sem fins lucrativos usam técnicas de guerrilha para tentar impactar o comportamento social negativo.
Alguns exemplos:
- Combate à violência doméstica;
- Combate à exploração de menores;
- Combate à condução sob o efeito de álcool ou drogas.
Filantropia
A filantropia estratégica ou corporativa ocorre quando uma empresa comercial faz doações para causas de beneficência, sem qualquer expectativa de ganho comercial.
Isso acontece quando uma empresa faz doações financeiras para causas, mas não as menciona na sua comunicação de marketing, ou nas suas campanhas de venda.
Patrocínio
O patrocínio acontece quando a empresa paga para ter o seu nome associado às atividades de uma instituição de solidariedade social.
Um exemplo é a campanha “Lugar à Mesa”, uma associação entre a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa e o Grupo Nabeiro e que visa o fornecimento de refeições a cerca de 1000 famílias em dificuldades, apoiando simultaneamente 25 restaurantes fornecedores.
Caridade
O marketing de causas envolve sempre uma empresa com fins lucrativos. Se apenas uma empresa sem fins lucrativos está envolvida, essa atividade designa-se por caridade.
Uma instituição de caridade é uma organização que fornece apoio a uma causa que escolheu ou a um conjunto de causas.
A “Rede de Emergência Alimentar” é uma causa liderada pelo Banco Alimentar Contra a Fome e que pretende dar resposta à situação dramática de quem sofreu o impacto económico negativo das medidas COVID.
Angariação de Fundos
Ao contrário das metas de marketing, que são amplas e de longo prazo, as metas de arrecadação de fundos são concretas e de curto prazo.
No fundo, se o argumento é a dádiva de um montante para uma causa isolada, está-se na área da angariação de fundos e não estamos a falar de marketing de causas.
Vantagens do Marketing de Causa
As organizações sem fins lucrativos enfrentam, desde a sua origem, o enorme desafio do financiamento das suas atividades.
Por outro lado, as marcas/empresas lutam por se destacar da concorrência, entre outras formas, através de uma cada vez maior ligação e empatia com o seu público-alvo.
O marketing de causa tem vindo a ser cada vez mais adotado, porque contribui para a resolução destes dois diferentes desafios.
Organizações Sem Fins Lucrativos
Para angariar fundos, ou aumentar a notoriedade das suas causas, as organizações sem fins lucrativos foram-se adaptando à evolução da tecnologia, recorrendo à web, redes sociais e a novas ferramentas de financiamento, como o crowdfunding.
Aprenderam também que podiam obter o apoio das marcas/empresas para as suas causas, através do marketing de causa, ganhando a voz e presença que, isoladas, teriam dificuldades em alcançar.
Os benefícios do marketing de causa, para organizações sem fins lucrativos, são claros:
- Nova receita, proveniente dos novos doadores;
- Maior conscientização do púbico para as suas causas;
- Mais oportunidades para as causas.
Organizações Com Fins Lucrativos
A responsabilidade social das marcas/empresas é cada vez mais escrutinada pelos consumidores, numa tendência que se está a tornar cada vez mais global.
Como os consumidores de hoje valorizam a transparência, as melhores campanhas de marketing de causa devem ser genuínas e de longa duração, como faz de forma exemplar, em Portugal, o Grupo Nabeiro.
Por tudo isto, as marcas/empresas entenderam também os benefícios de se aliarem a organizações sem fins lucrativos, apoiando as suas causas, porque:
- Têm a oportunidade de se conectar com o seu público-alvo por meio de valores partilhados e da dedicação a um bem maior;
- As doações corporativas podem afetar diretamente os resultados financeiros, de uma forma positiva, porque atraem mais e melhores clientes;
- As causas apoiadas pela marca/empresa atraem, motivam e mantêm os seus funcionários.
Formas de Marketing de Causa
Algumas empresas tratam o marketing de causa como uma atividade esporádica ou fazem parceria com uma organização sem fins lucrativos para uma promoção específica, enquanto outras consideram o marketing de causa um componente crítico da sua estratégia de negócios de longo prazo.
Independentemente da forma como a marca/empresa vê o marketing de causa, entre as opções à sua disposição para o fazer, encontram-se as seguintes:
Micro-doações
Uma das opções mais simples de implementar, mas muito eficaz, consiste na disponibilização de uma caixa para doações para uma causa, num espaço físico de uma empresa onde circulam os clientes.
Esta forma de marketing de causa é muitas vezes protagonizada por pequenas empresas, ou comércios locais.
Compre um, dê um
Nesta forma de marketing de causa, cada compra de um produto da empresa resulta numa doação para uma comunidade escolhida, que enfrenta uma qualquer dificuldade.
Inicialmente este modelo envolvia a doação de um produto semelhante, mas progressivamente, novas variantes desta forma, começaram a dirigir os donativos para outras necessidades da comunidade, ou para questões ambientais.
100% das vendas doadas a uma causa
Neste modelo, as empresas anunciam que o total de vendas, num determinado período de tempo, reverterá na totalidade para uma causa.
É conveniente entender-se que esta doação implica um custo para a empresa superior ao valor das vendas, porque não leva em conta impostos, embalagens, tempos dos empregados, sistema de pagamentos, entre outros custos.
Doação com uma compra
Neste formato, associa-se uma doação por cada produto especialmente marcado, vendido durante um período de tempo pré-determinado.
A doação pode variar e pode ser descrita em termos de percentagem sobre o preço de cada produto.
Doação com resgate de coupons
Doar cupons é uma forma de apoiar instituições de caridade, ou famílias carenciadas, sem envolver dinheiro real.
Tipicamente uma compra dará direito a um cupon, que pode ser doado automaticamente para uma causa escolhida, não sendo a venda em si que desencadeia a doação, mas a ação complementar.
Parceria de voluntariado
As parcerias de voluntariado normalmente envolvem uma empresa grande empregadora, que celebra um acordo de voluntariado com uma Instituição de Solidariedade Social.
A empresa incentiva os seus colaboradores a doarem algum do seu tempo a essa causa, podendo, ou não, dispensar algum do tempo de trabalho para o efeito.
Apoiante orgulhoso
Nesta forma de marketing de causa uma empresa faz uma doação fixa para uma causa/organização sem fins lucrativos e a doação não está vinculada à venda de um produto ou a qualquer ação do consumidor.
Doação com ação do consumidor
Um método que não requer compra e acontece se uma empresa faz uma doação quando o consumidor realiza uma ação específica (por exemplo, partilha uma campanha da empresa nas suas redes sociais).
Doação de incentivo duplo
Uma promoção de incentivo duplo acontece quando uma empresa faz uma doação (de um cupon, por exemplo), por cada doação que o cliente também fizer.
Doação direcionada pelo consumidor
Este modelo permite que os consumidores determinem onde e como a doação de uma empresa é realizada, seja a partir de uma lista definida ou nomeando as instituições de caridade favoritas.
Incentivo ao voluntariado
Neste modelo uma empresa incentiva os consumidores a doar tempo em prol de uma causa social, sendo os consumidores recompensados pelo seu voluntariado com produtos/serviços gratuitos.
Doação em vez de ofertas
Neste modelo a empresa substitui as ofertas a clientes, ou empregados, por uma doação de valor semelhante ou superior, para uma causa.
Organização de campanha de doação
Muitas instituições de solidariedade podem não ter meios, nem know-how, para lançar uma campanha de doação.
Neste modelo as empresas podem organizar a campanha, eventualmente recorrendo a novas formas de comunicação, ou de financiamento, como acontece com o crowdfunding.
Qual o futuro do Marketing de Causa?
O marketing de causa tem vindo a crescer nos últimos anos e existem múltiplas razões para acreditar que continuará a crescer no futuro, embora outras possam travar essa tendência.
Vejamos algumas delas:
Aspetos que jogam a favor do crescimento
Consumidores conscientes das grandes causas
Um estudo recente da Zendesk, mas anterior à pandemia, mostra que a percentagem de consumidores conscientes das questões sanitárias, sociais e ambientais, suplanta a dos consumidores indiferentes, nos diversos países do mundo, numa proporção média de 3 para 1.
Consumidores mais exigentes e com mais poder
As tecnologias digitais avançam a cada dia que passa e ameaçam os meios unidirecionais de comunicação como a TV e a Rádio, muito usados pelas grandes marcas.
Os consumidores podem agora intervir e exigir transparência e responsabilidade social às empresas, usando principalmente as redes sociais e afetando as marcas de forma positiva, ou negativa.
Alteração nos valores e crenças dos Consumidores
Estamos progressivamente a ver-nos como humanos, como iguais e os consumidores estão progressivamente a exigir maior humanização da relação com as marcas/empresas.
Conhecimento, compaixão, empatia e emoção devem estar cada vez mais presentes nas organizações, que tenderão elas próprias a ser mais reflexivas, de valor acrescentado e socialmente responsáveis.
Preferência dos Consumidores por Marcas com causas
As marcas que aderem a causas significativas têm crescido de forma regular ao longo dos últimos anos, de acordo com a Havas.
Da mesma forma, existem estudos que mostram que os consumidores admitem comprar mais a empresas que demonstram responsabilidade social.
Bloqueadores de anúncios
Mesmo com tecnologias sofisticadas de segmentação de anúncios, existe sempre a possibilidade dos consumidores se desligarem da publicidade das marcas.
Esta possibilidade reforça o poder dos consumidores seguirem cada vez mais as empresas com as quais se identificam e não as que os bombardeiam com publicidade não desejada.
Aspetos que jogam contra o crescimento
Consumidores podem preferir preço ou conveniência
Existe uma percentagem significativa de consumidores para os quais as marcas podem não importar tanto quanto o preço ou a conveniência, por razões diversas, mas muitas vezes ligadas aos limitados orçamentos familiares.
Para estes, as marcas socialmente responsáveis podem desaparecer e ser substituídas pelas que lhes garantam melhor o controlo do seu orçamento.
Fake news e factos alternativos minam confiança
Com a prevalência de notícias falsas, fatos alternativos e outros, o padrão para a maioria dos consumidores tornou-se “não confiar”.
Na verdade, a confiança nas instituições tradicionais está a cair numa parte significativa do globo, especialmente no que diz respeito a partidos e governo, enquanto as ONGs parecem merecer níveis superiores de aprovação.
Monopólios travam a tendência
Embora tenha havido uma proliferação de startups, estas acabam grande parte das vezes, por ser adquiridas por grandes corporações.
Estas grandes corporações umas vezes apropriam-se da afinidade existente entre os consumidores e as startups adquiridas, outras descartam a sua vertente de responsabilidade social, ou tornam apoios locais, em apoios globais.
Algoritmos de IA podem influenciar
Também alguns mecanismos que tenderemos cada vez mais a usar, podem influenciar a nossa compra de formas subtis.
Motores de busca e assistentes pessoais, como a Alexa, ou a Siri, podem dirigir-nos para as grandes marcas e não para as mais socialmente responsáveis.
Conclusão
A tendência para o crescimento do marketing de causa será acentuada com a pandemia covid-19, porque todo o mundo compreendeu a dependência que temos uns dos outros e os resultados extraordinários que se podem obter quando globalmente nos unimos em torno de uma causa.
Podemos chamar-lhe “novo normal”, “grande reset“, “momento ctrl + alt + del”, “momento eureka”, ou o que quisermos, desde que se entenda que estamos no meio de uma revolução e que as coisas não voltarão a ser como antigamente.
Esta nova realidade irá fazer aparecer novas causas que o marketing das empresas terá que adotar para se conectar ao seu público.
Esta convicção resulta do que acreditamos serem tendências firmes que estarão presentes no pós Covid-19, como acontece, por exemplo, com as seguintes:
- As marcas de futuro terão que falar sobre fazer o bem e também fazer o bem, ou os consumidores não irão comprar, devendo o marketing de causa ser encarado como estratégico;
- O teletrabalho vai passar a ser normal porque o trabalho deixou de ser um lugar, alterando-se aspetos tão distintos como a privacidade e segurança de dados, horários de trabalho, seguros, subsídios de alimentação, contratação e recrutamento online, entre outros aspetos;
- Reuniões serão cada vez mais realizadas por videoconferência, reduzindo a necessidade de viagens longas e tempos de espera, com impacto na estrutura de custo das empresas e na oferta do comércio local e transportes;
- O delivery, que teve um enorme desenvolvimento durante a pandemia, passará a ser normal, havendo que se fazer um esforço de adaptação de processos, incluindo a promoção usabilidade e acessibilidade dos canais online.
Por tudo o que referimos anteriormente, acreditamos num futuro do marketing de causas ainda mais presente nas estratégias das marcas/empresas.
Referências:
https://www.conecomm.com/insights-blog/top-10-types-of-cause-promotions
https://hbr.org/2016/02/the-elements-of-an-effective-cause-marketing-campaign
https://www.refuelagency.com/refuel-your-cause-marketing/
https://www.refuelagency.com/blog/what-is-cause-marketing/
https://www.marketing-schools.org/types-of-marketing/cause-marketing/#section-0
https://hbr.org/2017/01/survey-peoples-trust-has-declined-in-business-media-government-and-ngos
https://www.marketing-schools.org/types-of-marketing/cause-marketing/#section-0